Parece coisa de cinema. Recebi um e-mail narrando dois casos, em que autoridades utilizaram cachorros como meio de prova em processos criminais. As notícias sugerem que os cães teriam sido “testemunhas”.
O primeiro caso ocorreu na França e envolve a investigação sobre de homicídio cometido contra um cidadão parisiense, dono do cão “Scooby”. Segundo o site G1, na audiência preliminar, o pacato animal, ao ser confrontado com suspeitos da autoria do delito, latiu ferozmente. Por isso, a justiça francesa determinou a participação do cão no julgamento, onde será novamente “ouvido” em Tribunal.
O outro caso ocorreu nos EUA e trata do crime de maus tratos, cometido contra um pitbull, batizado de “Louis Vuittonque”. Na espécie, o cachorro fora espancado e queimado por seu dono, o qual, em razão desse covarde ato, sofreu condenação a 9 anos de prisão. Ao pleitear a concessão de liberdade condicional junto ao Comitê de Condicional do Alabama, esse órgão resolveu “ouvir” o cachorro, decidindo pelo indeferimento do pedido de liberdade, após verificar o abalo moral do cão frente ao seu agressor.
A pergunta que não quer calar é a seguinte: um cachorro pode ser utilizado como meio de prova à luz do Direito Processual Penal brasileiro?
Segundo os processualistas penais Nestor Távara e Rosmar Alencar, a busca pela verdade real é a meta do processo penal. Assim, o sistema probatório pauta-se no princípio da liberdade na produção probatória. Dizem os citados autores:
“O CPP não traz de forma exaustiva todos os meios de prova admissíveis. Podemos, nesse viés, utilizar as provas nominadas, que são aquelas disciplinadas na legislação, trazidas nos arts. 158 a 250 do CPP e também as inominadas, é dizer, aquelas ainda não normatizadas (atípicas). O princípio da verdade real, iluminando a persecução criminal, permite a utilização de meios probatórios não disciplinados em lei, desde que moralmente legítimos e não afrontadores do próprio ordenamento.” (Curso de Direito Processual Penal, 3ª ed., 2009, p. 311).
Por isso, a depender do caso concreto, pensamos que um cão ou qualquer outro animal doméstico capaz de se comunicar poderia ser utilizado como meio de prova, excepcionalmente, no Brasil. É claro que os latidos do cachorro, por si só, não podem embasar uma condenação; no máximo, podem funcionar como indício, a ser confirmado por outras provas.