Considerações sobre o aborto de fetos anencéfalos

30 de setembro de 2009

Em breve, o Supremo Tribunal Federal julgará o mérito da ADPF 54, que foi interposta pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Saúde – CNTS contra dispositivos do Código Penal para excluir a interpretação de que é crime o aborto de fetos anencéfalos. O subscritor da inicial é o notável advogado e professor de Direito Constitucional Luís Roberto Barroso.

A questão é extremamente polêmica, pois envolve Direito e Religião. Para se ter uma idéia das divergências, quando do julgamento da liminar, o então Procurador-Geral da Repúlbica Cláudio Fonteles opinou na sessão contra o pedido contido na ADPF; contudo, recentemente, a então Procuradora-Geral interina, Débora Duprat, ofereceu parecer favorável. Além disso, uma grande audiência pública, conduzida pelo Ministro Marco Aurélio, mostrou como nos meios científicos existem as mais diversas opiniões a respeito do tema.

Segundo o Professor de Direito Penal Rogério Sanches, anencéfalo é o embrião, feto ou recém nascido que, devido a má formação congênita, não possui parte do sistema nervoso central. Falta-lhe um dos hemisférios cerebrais ou uma parcela do troco encefálico.

De acordo com a literalidade do art. 128 do Código Penal, o aborto de feto anencéfalo é crime, pois não está autorizado nos casos de aborto eugênico. Além disso, a Exposição de Motivos da Parte Especial não deixa dúvidas que o aborto, nesses circunstâncias, constitui infração criminal.

Para segmentos da doutrina, o aborto de feto anencéfalo enquadra-se como hipótese extralegal de exclusão da culpabilidade, consistente na inexigibilidade de conduta diversa. Contudo, só pode ser alegada pela gestante na opinião de Bitencourt. Além disso, há autores que sustentam que feto anencéfalo não tem vida. Por conseguinte, não morre juridicamente, sendo a questão ligada à saúde e à intimidade da mulher, não devendo a coletividade e o Estado se imiscuírem nesse campo pessoal.

Em algumas decisões, a jurisprudência mais recente já autorizou abortos de fetos naquelas condições, desde que comprovados três requisitos: a)  inviabilidade da vida extraulterina; b) comprovação da anomalia em perícia; c) prova de dano psicológico à gestante.

Diante desse quadro, resta esperar a posição definitiva do STF acerca desse complexo tema. Na liminar, a Corte limitou-se a suspender os processos em trâmite  envolvendo a questão, nestes termos:

ADPF – ADEQUAÇÃO – INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ – FETO ANENCÉFALO – POLÍTICA JUDICIÁRIA – MACROPROCESSO. Tanto quanto possível, há de ser dada seqüência a processo objetivo, chegando-se, de imediato, a pronunciamento do Supremo Tribunal Federal. Em jogo valores consagrados na Lei Fundamental – como o são os da dignidade da pessoa humana, da saúde, da liberdade e autonomia da manifestação da vontade e da legalidade -, considerados a interrupção da gravidez de feto anencéfalo e os enfoques diversificados sobre a configuração do crime de aborto, adequada surge a argüição de descumprimento de preceito fundamental. ADPF – LIMINAR – ANENCEFALIA – INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ – GLOSA PENAL – PROCESSOS EM CURSO – SUSPENSÃO. Pendente de julgamento a argüição de descumprimento de preceito fundamental, processos criminais em curso, em face da interrupção da gravidez no caso de anencefalia, devem ficar suspensos até o crivo final do Supremo Tribunal Federal. ADPF – LIMINAR – ANENCEFALIA – INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ – GLOSA PENAL – AFASTAMENTO – MITIGAÇÃO. Na dicção da ilustrada maioria, entendimento em relação ao qual guardo reserva, não prevalece, em argüição de descumprimento de preceito fundamental, liminar no sentido de afastar a glosa penal relativamente àqueles que venham a participar da interrupção da gravidez no caso de anencefalia.
(ADPF 54 QO, Relator:  Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 27/04/2005, DJe-092 DIVULG 30-08-2007 PUBLIC 31-08-2007)

Questões da prova discursiva do concurso de Juiz Federal Substituto – TRF da 5ª Região

29 de setembro de 2009

Nos dias 26 e 27 de setembro de 2009, foram realizadas as provas escritas do concurso público para provimento de cargos de juiz federal substituto do Tribunal Regional Federal da 5ª Região. No dia 26, os candidatos se submeteram a uma sentença civil e a duas questões dissertativas (P2). No dia 27, o desafio foi uma sentença penal e de mais duas questões subjetivas (P3).  Ao todo, foram quatro questões discursivas, caracterizadas pelo alto grau de dificuldade. Assim, em primeira mão, vamos brindar os leitores deste blog com a transcrição dessas questões. Quem souber algo a respeito delas, sinta-se a vontade para comentar.

Prova escrita P2 (26/09/2009)

Questão 1 – Estabeleça, com a devida fundamentação, as diferenças entre a situação de inconstitucionalidade por omissão geral e a inconstitucionalidade por omissão parcial, no que se refere aos instrumentos de controle.

Questão 2 – Considerando o atual estágio do direito ambiental brasileiro, explique se há fundamento para o princípio do poluidor-pagador e para se considerar como princípio de direito ambiental o do usuário-pagador, inclusive quanto à tendência de aplicação deste último no que se refere aos recursos não econômicos e aos abióticos.

Prova escrita P3 – (27/09/2009)

Questão 1 – Que recurso é cabível contra decisão judicial denegatória de antecipação dos efeitos da tutela em ação movida pela Organização dos Estados Americanos contra sociedade comercial, com pedidos de suspensão de atividade caracterizada como trabalho escravo e indenização por danos mateiriais e  morais? Fundamente sua resposta.

Questão 2 – Quais são as especialidades do Protocolo de Las Leñas sobre Cooperação em Matéria Civil, Comercial, Trabalhista e Administrativa, em relação à homologação de sentenças estrangeiras e às cartas rogatórias. Fundamente sua resposta.


Em breve, os novos subsídios dos Ministros do STF

15 de setembro de 2009

            Em julho de 2006, a então Presidente do STF enviou à Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 7.297/2006, para aumentar os subsídios dos Ministros daquela Corte e, por conseqüência, de todo o escalonamento remuneratório da magistratura nacional.

             Esse projeto de lei não prosperou, perdendo-se nas Comissões da Câmara dos Deputados. A justificativa para a postura política que resultou na não aprovação imediata residiu nos efeitos financeiros retroativos que a proposta previa. Se fosse aprovada hoje, a lei acarretaria o pagamento das diferenças  desde janeiro de 2007.

              Para superar o impasse, o STF enviou novo projeto de lei ao Poder Legislativo da União. Trata-se do PL nº 5.921/2009, o qual prevê três aumentos sucessivos para os magistrados: a) setembro de 2009 – 5,00%; b) novembro de 2009 – 4,60%; c) fevereiro de 2010 – 3,88%. Como desde 2006 os subsídios estão em R$ 24.500,00, a implantação desses percentuais significará um patamar de R$ 27.952,39, em fevereiro de 2009.

            O novo projeto de lei foi aprovado rapidamente na Câmara e seguiu para o Senado onde, ao que parece, deverá ter igual destino.

            Juridicamente, a proposta atende aos mandamentos constitucionais de responsabilidade fiscal e de previsão orçamentária. Além disso, a lei apenas repõe as perdas decorrentes da inflação. Contudo, para a opinão pública em geral, será mais um motivo para apedrejar o Poder Judiciário.


Novas Súmulas do STJ – Setembro de 2009

8 de setembro de 2009

               Em 01 de setembro de 2009, foram publicadas pelo STJ quatro novas Súmulas. Os enunciados tratam de Direito Processual Civil (ação de exibição de documentos), Responsabilidade Civil (dano moral) e Direito Tributário (isenção de imposto de renda). Os temas das súmulas são relevantes e com certeza aparecerão nas provas objetivas de concursos públicos. Vale a pena conferir:

Súmula 389 – A comprovação do pagamento do “custo do serviço” referente ao fornecimento de certidão de assentamentos constantes dos livros da companhia é requisito de procedibilidade da ação de exibição de documentos ajuizada em face da sociedade anônima.

Súmula 388 – A simples devolução indevida de cheque caracteriza dano moral. 

Súmula 387 – É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral.

Súmula 386 – São isentas de imposto de renda as indenizações de férias
proporcionais e o respectivo adicional.


O Supremo Tribunal em luto – Homenagem ao Min. Menezes Direito

3 de setembro de 2009

              Ministro Menezes Direito                                                                                                                                                      Há dois dias, o Supremo Tribunal Federal perdeu um grande jurista: o Ministro Menezes Direito. Enterrado ontem no Rio de Janeiro, resta-nos fazer uma homenagem final a essa grande figura, vitimada por problemas graves no pâncreas.

    Quem acompanhou as sessões do Plenário do STF com o Ministro Direito em atuação percebeu suas principais características pessoais: um homem educado, que sempre encarava com respeito e cordialidade as divergências. Além disso, Direito era dotado de muito bom senso em suas ponderadas intervenções, isso sem falar na clareza de seu raciocínio.

                 Desde os tempos do STJ, Menezes de Direito era conhecido por ser um trabalhador implacável. Diligente, sempre redigia os votos em casos novos e relevantes, sendo um zeloso observador do trabalho de sua assessoria.

                   Direito nasceu em 8 de setembro de 1942 em Belém, no Pará. Formou-se em Direito pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro, em 1965. Alcançou o título de doutorado em 1968. Atuou como ministro do Superior Tribunal de Justiça por 11 anos, depois de passar pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro como desembargador, entre 1988 e 1996. Antes de ingressar na magistratura, foi advogado no Rio de Janeiro, onde ocupou diversos cargos na Administração Pública.


Prazo do estágio probatório – a nova jurisprudência do STJ e do STF

3 de setembro de 2009

1. Durante muito tempo, era firme no Superior Tribunal de Justiça o entendimento no sentido de que o período do estágio probatório não se confunde com o prazo para aquisição de estabilidade no serviço público.  Enquanto o período de estágio probatório, nos termos do art. 20, caput, da Lei nº 8.112/90 seria de 24 meses, o prazo de estabilidade seria de 03 anos, tal como previsto no art. 41 da CF, com redação dada pela EC nº 20/1998. Atualmente, esse entendimento não mais persiste no STJ e no STF.

2. Considerando que os institutos do estágio probatório e da estabilidade são distintos, porém extremamente interligados, o STJ entendeu que não há como se conceber prazos diferenciados para eles, sob pena de se frustrarem as finalidades da EC nº 20/1998.  Eis a mais recente decisão  sobre esse relevante tema:

MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. ESTABILIDADE. ART. 41 DA CF. EC Nº 19/98. PRAZO. ALTERAÇÃO. ESTÁGIO PROBATÓRIO. OBSERVÂNCIA.
I – Estágio probatório é o período compreendido entre a nomeação e a aquisição de estabilidade no serviço público, no qual são avaliadas a aptidão, a eficiência e a capacidade do servidor para o efetivo exercício do cargo respectivo.
II – Com efeito, o prazo do estágio probatório dos servidores públicos deve observar a alteração promovida pela Emenda Constitucional nº 19/98 no art. 41 da Constituição Federal, no tocante ao aumento do lapso temporal para a aquisição da estabilidade no serviço público para 3 (três) anos, visto que, apesar de institutos jurídicos distintos, encontram-se pragmaticamente ligados.
III – Destaque para a redação do artigo 28 da Emenda Constitucional nº 19/98, que vem a confirmar o raciocínio de que a alteração do prazo para a aquisição da estabilidade repercutiu no prazo do estágio probatório, senão seria de todo desnecessária a menção aos atuais servidores em estágio probatório; bastaria, então, que se determinasse a aplicação do prazo de 3 (três) anos aos novos servidores, sem qualquer explicitação, caso não houvesse conexão entre os institutos da estabilidade e do estágio probatório.
PROCURADOR FEDERAL. PROMOÇÃO E PROGRESSÃO NA CARREIRA. PORTARIA PGF 468/2005. REQUISITO. CONCLUSÃO. ESTÁGIO PROBATÓRIO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. INEXISTÊNCIA.
IV – Desatendido o requisito temporal de conclusão do estágio probatório, eis que não verificado o interstício de 3 (três) anos de efetivo exercício da impetrante no cargo de Procurador Federal, inexiste direito líquido e certo de figurar nas listas de promoção e progressão funcional, regulamentadas pela Portaria PGF nº 468/2005. Ordem denegada.
(MS 12.523/DF, Rel. Ministro  Felix Fischer, Terceira Seção, julgado em 22/04/2009, DJe 18/08/2009)

3. No Supremo Tribunal Federal, decisões monocrática do Min. Gilmar Mendes  nas Suspensão de Tutela Antecipada – STA nº310 e 311 seguiram o entendimento de que o estágio probatório deveria ser de 03 anos. Recentemente, a 2ª Turma, em julgado relatado pelo citado Ministro, adotou essa interpretação, conforme notícia do Informativo nº 630/2011:

Procuradores federais e estágio probatório. Os institutos da estabilidade e do estágio probatório estão necessariamente vinculados, de modo que se lhes aplica o prazo comum de 3 anos. Com base nesse entendimento e ante a natureza constitucional do tema versado nos autos, a 2ª Turma acolheu embargos de declaração para, atribuindo-lhes efeitos infringentes, prover recurso extraordinário e, conseqüentemente, denegar a ordem de mandado de segurança concedida aos recorridos. Na espécie, os procuradores federais, ora embargados, impetraram mandado de segurança no STJ, concedido com a finalidade de que fossem avaliados no prazo de 24 meses para fins de estágio probatório. Desta decisão, a União deduzira recurso extraordinário, ao qual fora negado seguimento, em decisão monocrática. Na seqüência, interpusera agravo regimental, desprovido pela Turma, objeto dos mencionados embargos. Precedente citado: STA 269 AgR/DF (DJe de 26.2.2010).
AI 754802 ED-AgR/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 7.6.2011. (AI-754802)